sábado, 2 de maio de 2009

Sou



Sou ser etéreo, alma efémera que desaparecerá um dia da mesma forma que a gota de água se funde na terra.
Sou feita da névoa inebriante exalada pela noite negra e aconchegante, banhada pelo sol recém-nascido, beijada pela doce chuva.
Fundo-me com a água, sinto a erva morna entre os meus dedos, bailo com a brisa mansa, sinto fogo ardendo em meu sangue, chama que me mantém viva.
Sou como as sombras que bailam à distância de um relance, levemente tocadas por um olhar, descansando em altas e fortes árvores, protegendo-me, escondendo-me dos que me feririam, nunca permitindo que soubessem a minha existência.
Por ruas empoeiradas andei, rasguei os meus pés descalços nas pedras afiadas que se escondiam entre o caminho.
Eu era como um sonho. Vês-me. Sabes que estou lá. Mas não me poderás tocar. E no fundo sabes isto. Sabes que sou como uma estranha tontura que te toma e te liberta não deixando rasto senão o da leve memória.
Tive de correr. Lutar. Cortar os aguçados fios, resistentes como aço, que me prendiam e cortavam a carne, mantendo-me no meu lugar, impedindo-me de ser tudo o que poderia ser.
Não era de ninguém nem ninguém era meu. Livre como a corça selvagem que experimenta o vento indomável.
Mas foi no auge deste sentimento que ele surgiu eu. Que nasceu para mim. Acarinhado pela luz do sol, lavado pelo orvalho que vem com a aurora olhou nos meus olhos invadindo o fundo da minha alma. Como poderia dizer não a tão solene pedido?
Seus braços fortes envolveram-me no ardente calor dos seus lábios, despegando-me do meu sonho para alcançar o nosso. Fogo vivo ardia sob a minha pele contaminando o ar à nossa volta. A erva fresca foi nosso recreio entre sussurros e sorrisos.
Foi o único a chegar até mim. Aquele que tomei como meu. Não me libertei de quem não queria ser libertado por mim. Tornando-nos um só, um só sopro, uma só mente…
Ele é quem disse não ao negrume da vida para viver a minha existência etérea, efémera, que não seria recordada por ninguém a não ser pelos corações quebrantados que sonham com a liberdade da mente e do coração.